A angústia da imprensa tradicional em relaçao a seu próprio futuro? No Observatorio

Por Fred Ritchin – Traduçao de Jô Amado, ediçao de Leticia Nunes. Reproduçao de artigo  – What the World Press Photo of the Year Means for Photography, LightBox, Time, 24/2; postado ontem no Observatorio da Imprensa.

“Através das fotografias, o mundo torna-se uma série de partículas nao relacionadas, independentes; e a história – o passado e o presente – passa a ser um conjunto de textos curtos e inusitados” – escreveu Susan Sontag em 1977 – “A câmera torna a realidade mínima, administrável e opaca. É uma visao do mundo que nega a interconectividade, a continuidade, mas confere a cada momento o caráter de um mistério”.

A reaçao de Susan Sontag à fotografia há quase 40 anos foi semelhante à minha própria reaçao à foto serenamente ambígua que ganhou este ano o prêmio World Press Photo – exceto que, neste último caso, a fotografia é aparentemente sobre o desejo de se conectar de um grupo de homens cuja silhueta se vê sob um céu enluarado: “Migrantes africanos na praia de Djibuti, à noite, levantando seus celulares numa tentativa de captar um sinal barato da vizinha Somália – um frágil vínculo com parentes no exterior”.

Num mundo cada vez mais fragmentado onde o empreendimento jornalístico perdeu grande parte de seu caráter comunitário – fotógrafos profissionais têm cada vez menos lugares que apoiem este tipo de trabalho, os leitores se recusam a pagar para ver as imagens (caso consigam sequer encontrar o trabalho entre os bilhoes de fotografias tao rapidamente divulgadas pela internet) e os anunciantes se recusam a apoiar as publicaçoes que poderiam patrocinar seu trabalho – a fotografia escolhida para representar 2013 – um ano extraordinariamente turbulento e doloroso – é uma imagem tranquila, abstrata, cerimonial e quase-religiosa que remete às dificuldades da comunicaçao; dificuldades atualmente partilhadas pela comunidade fotojornalística.

Ao invés de separar uma fotografia do decurso do ano passado que poderia ter impacto na opiniao pública ou nos governos – uma tarefa muitas vezes solitária e perigosa do repórter fotográfico como consciência social –, foi escolhida uma imagem simbólica representando os problemas e necessidades da comunicaçao à distância. E o veículo representado na fotografia vencedora do prêmio – o telefone celular – nao por acaso é a principal ferramenta das redes sociais geradas por usuários (para texto, vídeo e fotografia) que evitam os veículos jornalísticos tradicionais. Na descriçao feita pela fotografia das 4 telinhas iluminadas levantadas em direçao ao céu noturno, percebe-se nao só a ascendência do telefone celular e o que ele representa na sociedade, mas também a angústia da imprensa mais tradicional em relaçao a seu próprio futuro.

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