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Desafio dos leitores | Precisamos aprender a lidar com a informaçao
O professor Carlos Castilho no Observatorio leia no original
Se há um segmento da sociedade brasileira que está precisando tornar visíveis os seus desejos e necessidades, este é o dos consumidores de jornais, revistas, telejornais e páginas noticiosas na web. O mundo mudou e as demandas da populaçao também, mas a imprensa continua agarrada a um modelo que mostra evidentes sinais de desgaste.
Temos hoje um déficit crescente de dados e informaçoes capazes de dar à sociedade elementos para a tomada de decisoes numa conjuntura cada vez mais complexa e interconectada. Opçoes relativamente simples – como comprar 1 equipamento doméstico – dependem cada vez mais de dados que permitam a escolha do produto certo, no preço adequado. 1 estudo norte-americano mostrou que metade dos consumidores locais compram produtos inadequados por falta de informaçao.
Se formos estender a demanda de informaçoes para questoes mais delicadas como relaçoes humanas, saúde e problemas legais, a carência de dados é ainda mais dramática porque cada caso é especifico de 1 determinado contexto social e individual.
O problema existe porque a imprensa precisa associar a oferta de conteúdos informativos à venda de publicidade comercial para sobreviver como negócio lucrativo. Nada contra existência de empresas, só que esse modelo de negócios nao consegue suprir a demanda por dados + informaçoes ligadas às necessidades da populaçao, sem depender de patrocínios e anúncios.
No caso da polêmica sobre os rolezinhos, a cobertura da imprensa revelou-se deficiente nao porque os repórteres e editores sejam despreparados, mas porque a publicidade dos shoppings força as empresas a buscar abordagens que nao comprometam receitas futuras. Nessas condiçoes, o público fica sem elementos reais para poder posicionar-se diante de uma questao que provocou insegurança na classe média urbana de várias capitais brasileiras.
Estamos diante de uma situaçao em que os consumidores de informaçoes acabarao sendo levados a promover o seu próprio rolezinho para que as empresas jornalísticas percebam o que a luta por sobrevivência financeira nao as permite ver claramente. É a busca de visibilidade dos leitores para a demanda insatisfeita por dados e informaçoes para o dia a dia das pessoas. Dados e informaçoes que permitam às pessoas fazer opçoes de acordo com suas necessidades e contexto social, em vez de suas escolhas serem condicionadas pela publicidade.
Também nada contra a publicidade, que é necessária e insubstituível. O problema é os publicitários identificarem claramente o que é propaganda visando negócios e a que está voltada para necessidades reais da populaçao. A guerra publicitária das operadoras de telefonia e de televisao é um exemplo de como a confusao proposital de dados e informaçoes transforma uma opçao de compra num desafio que pode acabar na escolha inadequada às necessidades do consumidor.
A primeira coisa que a imprensa deveria fazer para atender à insegurança informativa da populaçao seria procurar, de forma sistemática e continuada, ensinar as pessoas a lidar com a informaçao. Sao raríssimos os indivíduos que tornaram rotineira a checagem de dados e informaçoes de qualquer natureza. Na era da abundância informativa, nao dá mais para confiar numa única informaçao. Lidar com a informaçao implica uma série de hábitos e valores novos que ainda nao foram incorporados ao dia a dia das pessoas. Hábitos tanto na hora de dar uma informaçao quanto na de usá-la. O problema nao está só nos espertalhoes ou irresponsáveis, mas na crescente diversificaçao das percepçoes de um mesmo problema.
Antes da internet, como havia poucos canais de comunicaçao, a informaçao era escassa e geralmente limitada a um número muito reduzido de fontes. Na era digital, tudo isso mudou. Milhoes de pessoas passaram a publicar suas percepçoes e um mesmo fato, dado ou evento passou a ser percebido de forma diferenciada e nao necessariamente falsa. É a velha questao do copo meio cheio ou meio vazio reproduzida dezenas ou centenas de vezes para uma mesma situaçao. Nao se trata mais de distinguir apenas entre o certo ou errado, mas principalmente entre o melhor e o pior para uma determinada situaçao pessoal ou de grupo.
Aprender a lidar com a informaçao é talvez o nosso grande desafio em tempos de açao coletiva de vários segmentos sociais, todos buscando visibilidade pública num contexto cada vez mais complexo. Os leitores precisam cobrar isso da imprensa.
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