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Luciano Martins Costa | A medicina dos brancos | texto publicado no Observatório
Texto do Luciano Martins Costa hoje no Observatorio – foto – Médicos cubanos sob protestos, ao sair da Escola de Saúde Pública do Ceará – UOL.
A Justiça Federal negou liminar ao Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais, que pretendia conceder registros provisórios somente aos médicos estrangeiros ou formados no exterior que tenham seus diplomas validados no Brasil. Segundo a 5a Vara Federal de Belo Horizonte, a anunciada intençao da entidade, de negar o registro aos profissionais recrutados pelo programa Mais Médicos, representaria uma prática de reserva de mercado e causaria prejuízos aos doentes e usuários do Sistema Único de Saúde. A decisao vale para todo o país e estabelece um paradigma de realidade numa discussao que já havia resvalado para o terreno das pantomimas.
O presidente do CRM de Minas Gerais é o mesmo que havia declarado que seus afiliados deveriam se negar a atender pacientes cuja saúde sofresse qualquer problema após o trabalho dos médicos estrangeiros. Essa e outras atitudes, como as vaias e declaraçoes preconceituosas contra os cubanos que fazem treinamento em Fortaleza, provocaram repercussao negativa na opiniao pública, segundo análises publicadas pelos jornais nas ediçoes de hoje.
A notícia da decisao judicial foi destacada pelo jornal O Estado de S. Paulo, que publica também uma declaraçao da presidente da República condenando as manifestaçoes de preconceito contra os profissionais trazidos ao Brasil pelo programa Mais Médicos.
Aos poucos, a imprensa vai municiando seus leitores com mais informaçoes e menos declaraçoes, embora ainda predominem nas páginas dos diários as frases deste ou daquele personagem. Ainda no Estado e também na Folha de S. Paulo podem-se ler textos sobre o teor do contrato firmado entre o governo brasileiro e a Organizaçao Pan-Americana de Saúde (OPAS) para o recrutamento de médicos cubanos.
A Folha de S. Paulo destaca em seu noticiário o fato de o convênio com a OPAS, para importar profissionais de Cuba, ter sido assinado antes do lançamento oficial do programa Mais Médicos. Mas essa diferença no calendário nao tem a menor relevância, uma vez que o programa vinha sendo preparado desde 2011. Trata-se, claramente, de uma picuinha a mais no extenso rol das traquinagens jornalísticas que fazem o estilo do jornal paulista.
As raízes do preconceito
Os textos sobre o acordo com a OPAS sao esclarecedores e desautorizam as manifestaçoes que se referem a “trabalho escravo”, financiamento de ditaduras e outras bobagens abrigadas pela imprensa. Mesmo assim, alguns articulistas ainda gastam papel para demonstrar sua pouca afinidade com expressoes como solidariedade e interesse público.
1 conhecido tributarista, que costuma ser convocado pela imprensa para falar de qualquer coisa, chama os profissionais arregimentados pela OPAS de “agentes públicos de Cuba que se intitulam médicos”. Na sua opiniao, a Venezuela se tornou uma “semiditadura” depois que aquele país passou a importar médicos cubanos.
Por trás dessa e outras expressoes de insensibilidade com relaçao às carências da saúde pública, pode-se encontrar informaçoes interessantes para compreender a furiosa reaçao das entidades médicas brs contra a importaçao de profissionais formados em outros países. O Globo, por exemplo, foi buscar nos dados estatísticos do IBGE os fundamentos para uma constataçao preocupante: Medicina ainda é curso de perfil elitista no Brasil, diz o título da reportagem.
Trata-se de uma análise que mostra como, embora a populaçao br seja formada por 50,7% de cidadaos que se declaram pretos ou pardos, somente 1,5% dos médicos se consideram pretos e 13,4% se classificam como pardos.
Pesquisadores citados pelo jornal carioca ponderam que a vaia com que um grupo de médicos brs recebeu os profissionais cubanos em Fortaleza, e a manifestaçao de uma jornalista do Rio Grande do Norte que comparou as médicas daquele país a empregadas domésticas, resultam desse distanciamento elitista.
Embora programas sociais como o sistema de cotas para vagas nas universidades tenham amenizado essa diferença étnica nas escolas de medicina, esse é um setor do campo acadêmico que continua sendo reserva de jovens das classes mais abastadas, portanto, predominantemente brancos.
Por mais que rebusquem o dicionário e escarafunchem seus neurônios em busca de razoes aceitáveis para condenar o programa, os representantes da classe médica do Brasil e seus apoiadores na imprensa nao conseguem dissimular que, na verdade, falam em nome dessa elite preconceituosa.
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