O padrao Fifa nao chegou à midia – e nem chegará – Alberto Dines no Observatorio

Por Alberto Dines no Observatorio

O governo e alguns círculos do PT gostariam de interromper a lua de mel entre a presidenta Dilma Rousseff e a mídia iniciada antes mesmo da sua posse. Para isso precisariam obter a anuência do PMDB, mais especialmente do atual vice-presidente Michel Temer, que, por convicçao ou preguiça, empenha-se em manter a impressao de idílio.

Tudo indica que alguma ameaça será pendurada no programa que o Partido dos Trabalhadores registrará na Justiça Eleitoral para concorrer nas presidenciais. Para nao acirrar os ânimos, a planejada “regulaçao” ficará confinada à esfera econômica e concorrencial. O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), autarquia do Ministério da Justiça, já foi chamado a mediar pendências sérias que até envolveram o Grupo Globo. Ninguém denunciou a entidade por atuar contra a independência da mídia.

Fundado em 1962, o CADE funciona como um tribunal para prevenir, desarmar e punir abusos de poder econômico. É o equivalente da americana FTC – Federal Trade Commission (criada em 1914). Como nao é restrito à imprensa, evitam-se as semelhanças com órgaos executores da uma Lei de Imprensa.

Avanço significativo, porém distante do que se poderia considerar “padrao FIFA”. O CADE nao tem poderes para acabar com a aberrante ilegalidade instalada no Congresso Nacional, onde parlamentares sao simultaneamente concessionários de serviços públicos. Notadamente na mídia eletrônica. O órgao capaz de desbaratar essa anomalia é a Procuradoria Geral da República, que já recebeu alentados dossiês e os arquivou (um deles apresentado pelo Projor, entidade mantenedora deste Observatório).

O CADE também nao tem condiçoes de cassar as concessoes de emissoras pertencentes a confissoes religiosas, muito menos de proibir que emissoras de TV aberta arrendem seu horário para cultos religiosos, contrariando todos os princípios do Estado de Direito democrático e secular.

A reativaçao do CADE é uma fórmula jeitosa, capaz de minorar ímpetos oligopolistas, mas incapaz de estimular movimentos reestruturantes, reparadores ou, ao menos, renovadores. A mídia continuará desconectada do interesse público, atenta às jogadas empresariais e pessoais. Em outras palavras: continuará desnorteada, correndo como uma barata tonta, sem fôlego para arejar e estimular um debate mais sério.

Na capa da Ilustrada (Folha de S.Paulo, 2a, 2/6), uma brilhante entrevista com o jornalista americano David Carr revela o clima desinibido que impera na redaçao do New York Times, onde é possível reportar livremente uma crise interna, a demissao sumária do diretor ou o tropeço do acionista principal. Truque perfeito: discute-se sem constrangimentos o direito à critica que gozam os jornalistas americanos e passa-se a impressao ao leitor brasileiro que isso é possível nestas bandas. Experimentem.

O “padrao FIFA” na mídia compreende uma devassa na própria FIFA e na sua afiliada, a CBF. Isso nao foi feito e precisa ser feito com urgência. O efeito será equivalente a dez Pasadenas.

A extraordinária repercussao do livro do francês Thomas Piketty, “Capital no século 21”, foi distorcida pelo viés altamente conservador da nossa imprensa. Os textos elogiosos do Wall Street Journal e do Economist foram registrados, mas devidamente engavetados. Mencionou-se livremente a expressao “acumulaçao de riqueza”, mas evitou-se a palavra-tabu: concentraçao.

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