A pesquisa do Pew na midia br, o complexo de vira-latas rosnando outra vez

Por Luciano Martins Costa comentario no Observatorio da Imprensa

A imprensa brasileira reproduziu nesta 4a feira (4/6), resultado de pesquisa feita pelo Pew Research Center, um dos mais conceituados centros de pesquisa dos EUA. Cada um dos 3 principais diários de circulaçao nacional priorizou um subtema do estudo, dividido em 4 campos: a Copa do Mundo, a situaçao econômica do país, a reputaçao dos principais líderes políticos e o lugar do Brasil no mundo.

As conclusoes sao tiradas a partir de 1.003 entrevistas diretas com pessoas acima de 18 anos, entre os dias 10 e 30 de abril deste ano, e a margem de erro é de 3,8 pontos porcentuais. A consulta tem alcance restrito e pontual, seus resultados foram claramente influenciados pelo auge das manifestaçoes contra a Copa e pelo noticiário negativo sobre a economia, além das denúncias de corrupçao na Petrobras. Possivelmente por considerar esses aspectos, o Estado de S. Paulo e a Folha de S. Paulo deram pouca importância a ela.

O Estado escolheu o pessimismo com relaçao à economia como ponto mais importante da pesquisa, afirmando que a expectativa dos brasileiros desabou no período de apenas 1 ano, a partir das manifestaçoes iniciadas em junho de 2013. Curiosamente, o tradicional jornal paulista relaciona os protestos à situaçao econômica, expondo um aspecto contraditório do estudo, ao observar que 72% citaram a suposta falta de oportunidade de trabalho, quando os dados do período apontam um índice de desemprego inferior a 6%.

A Folha de S Paulo, com um texto menor e de menos destaque, concentra sua abordagem no tema da Copa do Mundo, retratando a falta de informaçao da maioria dos entrevistados sobre a organizaçao do evento, seus custos e a participaçao do poder público.

O Globo é o jornal que explora mais o resultado geral da pesquisa, com manchete principal e reportagem de página inteira, na qual apresenta um dado que distorce a compreensao do estudo. “Brasil: 72% de insatisfaçao”, diz o título.

É o complexo de vira-latas rosnando mais uma vez.

Quem quiser conhecer os dados completos e a análise oficial deve acessar o site do Pew Research Center. Ainda assim, é preciso manter o senso crítico, pois mesmo o texto original contém pelo menos um erro primário e algumas avaliaçoes questionáveis.

Por exemplo, no primeiro parágrafo pode-se ler que “o humor nacional do Brasil está amargo, após um ano em que mais de 1 milhao de pessoas tomaram as ruas das principais cidades do país para protestar contra a corrupçao, a inflaçao crescente e a falta de investimentos do governo em serviços públicos como educação, saúde e transporte público, entre outras coisas”.

Ora, todo cidadao que acompanhou com razoável interesse os protestos iniciados em junho do ano passado sabe que inflaçao nao foi uma das motivaçoes das passeatas, que começaram com o tema dos transportes públicos e depois se fragmentaram em reivindicaçoes específicas. O que houve foi muita notícia tendenciosa sobre variaçoes de preços, o que mostra que os analistas do Pew Center foram condicionados pelo noticiário catastrofista da imprensa.

A pesquisa aponta uma queda geral na credibilidade das instituiçoes, entre as quais o poder público (representado pelo governo), a polícia, os militares, e a imprensa – que caiu 12 pontos porcentuais em sua reputaçao. As lideranças religiosas foram as únicas que nao perderam a confiança da populaçao, ganhando 2 pontos porcentuais em relaçao a estudo semelhante feito em 2010.

Os jornais, evidentemente, passam ao largo da informaçao sobre a queda de sua própria credibilidade, embora se pudesse questionar esse dado, uma vez que se revela a forte influência do noticiário pessimista sobre o estado de ânimo da sociedade.

Outro aspecto interessante a se destacar é o fato de que a presidenta Dilma Rousseff aparece com popularidade em declínio, embora conte com 51% de avaliaçoes favoráveis, mas seus principais oponentes na disputa eleitoral sao ainda mais rejeitados pela amostragem consultada: o senador Aécio Neves (PSDB) tem 53% de desaprovaçao, com 27% de simpatizantes, e o ex-governador Eduardo Campos é rejeitado por 47%, contra 24% de pessoas que o julgam favoravelmente.

Conclusao: o Estado e a Folha perceberam a irrelevância da pesquisa, e o Globo usa dados que retratam uma circunstância superada para justificar sua visao negativa da situaçao nacional.

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